Em uma aula, o professor Pedro Pessoa fez uma reflexão sobre a relação entre forte e fraco, ego e essência e falou sobre a importância de enxergar com todo o corpo
Qual é nossa disposição em aceitar aquilo que é fraco, que é débil, que causa dor, que causa sofrimento e desconforto? Ao desenvolver nossa capacidade de atenção podemos trocar o que é fraco e débil por algo que é forte e estável. E, então, transformar aquilo que é forte e estável em algo suave, humilde.
Aquilo que é forte é insensível; e aquilo que é fraco, hipersensível. Quando temos dor, desconforto, alguma condição que gera sofrimento, essa é a parte que tem a sensibilidade mais aguçada. Temos que trazer a atenção para a região, compreender o quanto ela é frágil e, através, da prática, trazer estabilidade e força.
Funcionamos de maneira muito parecida com o que acontece do lado de fora de nós. Internamente, aquilo que é mais forte passa em cima daquilo que é mais fraco – aquilo que é mais forte não espera o que é mais fraco se fortalecer. E o nosso ego é aquilo que é mais forte em nós.
Como, através da prática, conseguimos diminuir este estado egocêntrico? Como podemos converter esta concentração de energia que se encontra no ego e distribuir igualmente por todo o corpo? Como fazer pranayama se tudo que conhecemos e fazemos é através do ego? Na prática de yoga aprendemos a descentralizar o poder que está concentrado nos punhos de ferro do ego e utilizá-lo para o benefício geral da constituição física e psíquica. Assim temos uma grande possibilidade de desenvolvimento interno.
Quando nós distribuímos essa inteligência por todo o nosso corpo? Assim que vamos abrindo os olhos de cada poro do nosso corpo.
Aos poucos, na medida que nós vamos diminuindo esse exagero do ego, essa ganância do ego, algumas coisas começam a aparecer. Não antes. O ego é o famoso Rei Insensível, que segue à risca o mantra “tudo para mim, nada para os outros”. Ele é completamente cego para os outros, só enxergando a si mesmo.
Onde estão meus olhos neste instante? Os nossos olhos são esses olhos que separam, que excluem? Ou estão por todo o corpo? Devemos permitir que a inspiração gradualmente abra esses olhos espalhados por todos os poros do corpo. Ao inspirar, devemos permitir que os olhos se abram, talvez em algumas partes estes olhos resistem em se abrir, talvez em outras partes eles se abram com mais facilidade. Esses olhos são sinônimos de inteligência, que vai se abrindo por todo o corpo.
Devemos permitir que essa inteligência se torne propriedade de todo o corpo, não apenas de uma parte ou de outra.
Segundo o Guruji, os asanas desenvolvem a nossa capacidade de enxergar. E de acordo com os Yoga Sutra de Patanjali, os asanas devem ser dominados antes dos pranayamas. Nossa capacidade de enxergar, segundo Guruji, deve ser tão sensível a ponto de tocar cada célula do corpo. Nada deve estar escuro, nada deve estar escondido da visão. A visão se torna esta capacidade sublime de sentir.
É neste ponto que, na realidade, iniciamos a nossa prática. Até este ponto é tudo preparação. E a partir daí podemos ingressar num outro mundo onde o ego não é mais o rei, mas o servo que dedica a sua existência para o desabrochar da consciência, da visão interior. E, neste instante, podemos fazer pranayama a partir desta face que não tem face: Nirakaram. Esse é um dos nomes de Vishnu, aquele que não tem rosto.
Foto de Fritz Jr.