Por B.K.S Iyengar
Trecho do Yoga Rahasya. Tradução livre de Maurício Frighetto
O curso de uma vida pode ser alterado por um flash do destino, resultado de ações e reações acumuladas de vidas passadas e que desempenham um papel na vida presente. É preciso aceitar os desafios quando o destino atinge como um raio. Os efeitos podem ser visíveis imediatamente em alguns, enquanto em outros podem levar décadas de esforços persistentes e pacientes. Eu pertenço à última categoria.
O destino sozinho não pode abrir os portões da sorte e tornar alguém bem-sucedido na vida. Um esforço persistente e determinado também é necessário para moldar um indivíduo.
Eu me considero um em um milhão que sucumbiu ao chamado daquele flash do destino. Atendi a esse chamado com fé, embora falhas após falhas me trouxessem desespero, desânimo e angústia. Persegui meu destino com determinação incansável, aceitando que esses fracassos poderiam atuar como um passo para o sucesso. Estou feliz que meus esforços frutificaram após 35 anos. Pode-se chamar isso de sorte, destino ou a graça de Deus!
A fé e os esforços incansáveis me fizeram entender e perceber que o propósito da minha vida era utilizá-la para o bem da sociedade e do mundo em geral.
É constrangedor falar ou escrever sobre si mesmo, mas deixarei de lado minha falsa modéstia e contarei como meu interesse pelo Yoga ganhou impulso e me transformou. Como eu, como uma nova luz, atraí as pessoas para o yoga tornando-o popular. Acho que esta narração da minha infância pode ajudar meus alunos, cujo destino os trouxe até mim, a criar coragem e força em suas práticas.
Meu nascimento
Eu nasci em uma vila chamada Belur no estado de Karnataka, Índia, no domingo, 14 de dezembro de 1918, às 3h, durante a epidemia de gripe de 1918. Minha mãe estava com gripe e havia pouca esperança de minha sobrevivência, mas Deus salvou nós dois. Eu parecia doente, com braços e pernas finos, estômago protuberante e cabeça pesada. Minha aparência não era atraente.
Minha primeira infância
Minha saúde começou a piorar por causa de surtos de malária, febre tifóide, e os médicos também suspeitaram que eu tivesse tuberculose nos pulmões. Naquela época não havia cura para essas doenças e muitas vezes enfrentei as mandíbulas da morte. Tornei-me um fardo para mim mesmo e para meus pais.
Meu pai deu seu último suspiro quando eu tinha apenas nove anos e sua ausência criou um vácuo em nossa família. Ninguém na casa poderia me orientar sobre como ter uma boa saúde. Minha escolaridade foi afetada porque fui forçado a ficar na cama. Tornei-me um aluno de fundo do canto nas aulas e consegui apenas obter notas no limite do necessário. As autoridades me promoveriam a uma classe superior na esperança de que eu tivesse um desempenho melhor no próximo ano. Os estudos tornaram-se monótonos e laboriosos.
O “flash do destino”
Minha vida mudou para melhor em março de 1934. Meu Guru, Sri T. Krishnamacharya (foto acima) também era meu cunhado – ele era casado com minha irmã mais velha. Antes de seu casamento, ele esteve em Varanasi e estudou em vários darshanas. Ele então foi para o Nepal e aprendeu Yoga com um grande mestre chamado Sri Ramamohana Brahmachari.
Ele conduziu seminários sobre yoga em vários lugares depois que voltou para sua terra natal em Karnataka. O Marajá de Mysore, o falecido Krishna Raja Wadiar Bahadur IV, ouviu falar de meu Guruji. Ele abriu e patrocinou um yogashala (shala = escola) no palácio Jagamohan de Mysore. O Marajá enviaria meu Guruji a vários lugares para propagar o yoga. Em 1934, o marajá o enviou com seus alunos para visitar Kaivalyadham em Lonavala e Bombaim.
Ele parou em Bangalore (onde eu residia) em seu caminho para Bombaim e me perguntou se eu ficaria com minha irmã em Mysore até que ele voltasse de Bombaim. Eu tinha ouvido falar dos palácios e jardins exuberantes da cidade de Mysore, mas não tivera uma oportunidade de vê-los. Então, de boa vontade concordei com sua sugestão e ele comprou minha passagem para Mysore. Este é o flash do destino que mudou o curso da minha vida.
Pedi permissão a meu cunhado para voltar a Bangalore quando ele voltasse de Bombaim. Ele sugeriu que eu ingressasse no High School em Mysore e que aprendesse alguns asanas para melhorar minha saúde em vez de permitir que eu voltasse para casa. Fiquei tentado a concordar com sua sugestão de ficar em Mysore e ingressar na escola local, pois nunca havia gozado de boa saúde. Ele também começou a me ensinar alguns asanas para melhorar minha saúde. Comecei a chamá-lo de “Guruji”, enquanto ele implantava a semente do Yoga em mim.
Leias os outros trechos:
Como o yoga me transformou (Parte 2)